Por Chiara Santomiero
ROMA, sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010 (ZENIT.org).- “Para ir a Istambul é necessária uma grande imaginação”. Este foi o “slogan” criado pelo frade Rubén Tierrablanca, então guardião da casa geral dos Frades menores em Roma, quando há alguns anos aceitou o convite para criar com dois outros companheiros a Fraternidade Internacional de Istambul, Turquia, para a promoção do diálogo ecumênico e inter-religioso.
Frade Tierrablanca discutiu esse assunto com ZENIT, quando se aproxima o sexto aniversário de nascimento da comunidade e do projeto ligado a ela.
–Em que consiste o projeto?
–Frei Tierrablanca: Há vários anos, a Ordem Franciscana, presente na Turquia desde o século XIII, pensava em uma presença que promovesse de modo especial o diálogo ecumênico e inter-religioso, a exemplo de São Francisco e de seu encontro com o sultão Malik-al-Kamil, em Damietta, em 1219. A presença de várias Igrejas cristãs – greco-ortodoxa, armenia, síria, protestante em suas diversas denominações – faz de Istambul um lugar especialmente adequado para a promoção do diálogo ecumênico. Com naturalidade, disso advém a abertura do encontro com as comunidades muçulmanas e judaicas.
Os tempos para a realização do projeto amadureceram em setembro de 2003, quando nos encontramos, primeiro três, logo foram quatro, no convento de S. Maria Draperis, no bairro central de Pera, para iniciar essa aventura. Acolhemos como um sinal da Providência que os quatro frades menores que se encontraram ali fossem provenientes de quatro países e continentes diversos: Coreia (Ásia), Congo (África), França (Europa) e México (América).
Já a partir de nós se faz real o desafio de uma convivência entre culturas e línguas diversas, em um país que não é de nenhum dos quatro. A fraternidade foi inaugurada oficialmente em fevereiro de 2004 pelo ministro geral, frei José Rodríguez Carballo.
–Quais atividades desempenharam?
–Fr. Tierrablanca: Em diversos âmbitos. Sobretudo, queremos ser presença franciscana para a relação com as Igrejas cristãs. Esta disponibilidade se traduz na atenção para as festividades, cerimônias religiosas, eventos relevantes vividos por cada Igreja e na organização de momentos comuns de contraste e oração.
Acabou de terminar a semana de intercessão pela unidade dos cristãos durante a qual, como habitualmente em todas as partes, houve celebrações em diversas igrejas. Foi bonito constatar não só uma maior participação dos fieis, mas também uma maior mistura entre eles e a presença nas celebrações em diferentes igrejas. Pela primeira vez, também nessa ocasião as Igrejas orientais estão usando o idioma turco para a oração, e não o grego ou o sírio: não são passos de pouca importância. De maneira progressiva, se adquire cada vez mais confiança um nos outros.
A fraternidade de Istambul tem também o objetivo de ser presença franciscana em busca da relação com o Islã. Ainda que não somos considerados especialistas na matéria, realizamos um estudo constante e profundo das religiões com as quais entramos em contato.
Outro empenho é oferecer aos irmãos de todo o mundo períodos de formação sobre o diálogo ecumênico e inter-religioso. A experiência direta de viver junto a outras Igrejas e comunidades religiosas permite entrar mais facilmente no espirito do diálogo. São abertos a quem quiser e acontecem em outubro, normalmente de 17 a 28, por que no dia 27 há uma oração inter-religiosa no espirito do encontro de Assis, querido naquela tempo por João Paulo, em 1986.
O último aspecto de nossa atividade é levar fora da Turquia – ali onde nos convidam a fazer – reflexões sobre nosso caminho aqui.
–Muitos projetos...
–Frei Tierrablanca: E projetos para se sonhar. Com espírito franciscano: nada se ensina, mas se aprende muito.
Dos projetos elaborados em um escritório, frequentemente derivam desilusões. Talvez não encontramos tudo o que esperávamos ao vir aqui, porém muito mais do que desejávamos. Descobrimos o desejo de todos os cristãos de ter um contato e esta é benção de ser poucos.
O diálogo com o Islã nem sempre é fácil, mas na Turquia há boas relações de amizade em comparação com outros países.
–Não pesa ser uma minoria?
–Frei Tierrablanca: Nem sempre onde estão garantidas todas as possibilidades de expressão, a Igreja é a mais autêntica e forte. Aqui é dada a nós uma oportunidade de especialização radical da fé através do reconhecimento de que somos irmãos em Cristo, mantendo atenção e espírito na fé trinitária e com a Eucaristia como ponto de referência especial.
Veneramos juntos os santos do calendário católico e da Igreja oriental: isso abre à riqueza da tradição cristã, é como a comunhão dos santos. Sendo poucos temos a possibilidade de conhecer a todos, e caminhar juntos com o desejo de ser uma presença significativa.
A situação de minoria se converte em uma graça e a vocação religiosa e cristã se purifica e se aprofunda. São rompidas todas as estruturas mentais sobre o “sim” e “como”. Uma coisa que não havia nunca sonhado antes.
–Há restrições em sua atividade?
–Frei Tierrablanca: Purificar a fé significa também estabelecer a ordem das propriedades. Por lei – vale para todos, até mesmo o Islã –, fora dos lugares de oração está proibida toda atividade religiosa, exceto a voz do imame e o som dos sinos. É proibido celebrar nos hospitais, por exemplo, ou em escolas, e as procissões a céu aberto também são proibidas, mas você não pode dizer que uma fé manifestada desta forma é menos significativa.
É certo que existem dificuldades. Nos últimos anos, o grande crescimento da industrialização criou zonas habitadas fora das cidades, onde vivem também cristãos e católicos que não têm igrejas. Eles não podem vir sempre ao centro. Nós podemos visitar as famílias, porém não mais de uma vez, senão essa atividade é entendida como proselitismo e corre-se o risco de expulsão.
Mas não vivemos tudo isso com o peso que parece ter: por outro lado, nem Jesus nem Paulo mudaram o império romano. Limitaram-se a ir adiante.
O espírito franciscano é simples, alegre e respeitoso. Somos convidados e agradecemos a acolhida deste país. As limitações não nos impedem de viver nossa fé. As regras nos dão espaço para fazer as coisas que se podem fazer.
–Em outubro, acontecerá o sínodo sobre o Oriente Médio. Que itinerário de preparação está previsto?
–Frei Tierrablanca: Temos lido o documento de trabalho do sínodo e estamos programando o itinerário de reflexão sobre o texto. Justamente nesses dias houve um encontro das três casas da família franciscana – frades menores, conventuais e capuchinhos – para fazer um congresso juntos.
Com vistas ao sínodo, foi pensado também em uma reflexão comum com os muçulmanos, mas talvez o projeto é demasiado ambicioso. Foi, no entanto, proposto um encontro no meio de setembro junto a expositores da comunidade muçulmana e professores universitários para uma reflexão sobre os valores espirituais que tenham enfoque mais pastoral que doutrinário, de maneira que se coloque no centro a vida concreta das pessoas e de todos nós.
Espero que o sínodo nos ajude a amadurecer um pensamento compartilhado sobre as necessidades mais evidentes hoje na vida de nossas comunidades: a necessidade de voltar às raízes da fé para renovar a Igreja na Turquia e a necessidade de ampliar o diálogo ecumênico e inter-religioso em todos os níveis, não somente no institucional.
–O senhor é mexicano e esteve um bom tempo em Roma. Como se encontra nessa nova e complexa realidade?
–Frei Tierrablanca: Eu redescobri a alegria de me “manifestar” como cristãos. Aqui um “rahiq”, um consagrado, é muito estimado pelas pessoas, porque há um grande respeito pela consagração a Deus, para além da religião que pertence.
Quem me conhece sabe que digo frequentemente: “Eu nasci aos 50 anos, quando vim para Istambul”.
fonte: Zenit